Além dos inevitáveis e permanentes comentários sobre o tempo, o calor e outros fogos nas entranhas, como diria o cabrón Pedro Almodóvar, chegou a hora da maldita pergunta sobre o Réveillon.
Você ali no maior barraco de fim de feira amorosa com a gazela, numa D.R. (a mitológica discussão de relação) que mais parece cinema iraniano, e lá vem uma gaiata, dentes de porcelana à mostra, e manda, na lata:
- E aí, onde os pombinhos vão passar o fim de ano?
Antes que você diga que está em dúvida, o que é normalíssimo, a serelepe, mais falsa do que alegria de celebridade em micareta, conta do pacote que comprou para Buenos Aires, sul da Bahia, Fortaleza ou Porto de Galinhas etc, etc.
Você nem sabe se estará mais junto da cria da sua costela até a última folhinha do ano e a vadia, toda patriçosa, toda planejada, a contar as vantagens do seu destino, do pacote, do hotel, da cascata de fogos, do jantar romântico incluído no preço e todas outras babaquices que nos deixam sem paciência -principalmente durante uma crise no namoro ou casamento.
Claro que é perversão pura da vagaba. Sabe como ninguém que os pombinhos, como ela cinicamente os trata, já não arrulham na mesma sintonia, já não comem o mesmo Pê-Efe com o apetite de quem janta num DOM, num Fasano, para citar apenas dois dos mais caros e metidos restaurantes de São Paulo.
Dá vontade de ser bem grosso, bruto como o amigo Lunga de Juazeiro. Porém, haja porém, você, macho sensível, moderno e civilizado, mantém a calma. Já não bastam as suas discussões internas sobre o assunto, que sempre rendem quiprocós e arranca-rabos, e ainda vem essa desalmada riscar o fósforo da intriga no paiol dos outros?!
Você ali, amigo, ainda concentrado na reta final do campeonato, além de enfrentar a cobrança em casa ainda tem que vacinar-se contra essas peruas-butantãs!? Você nas projeções do seu tricolor, do seu Palmeiras, do Mengo, do Inter, do Galo ou do Cruzeiro, vai ter de fechar todos esses detalhes da viagem logo agora?! O amigo ali fazendo mandinga para evitar o rebaixamento do seu Flu, do seu Náutico, do seu Bota... A pressão a essa altura é das maiores. Até mesmo para os solitários. Lembro de um ano que resolvi, relaxadamente, ficar em São Paulo, na buena, andava meio zen, nada de enfrentar o caos de aeroportos e rodagens.
A cidade foi esvaziando, o prédio da área da rua Augusta idem, aí o Everaldo, nobre porteiro paraibano fã do Metallica, me olhou com aquela cara de piedade, como quem diz "coitado do tiozinho, deve tá duro, sem grana, não pode ir nem ali na Baixada Santista, na Praia Grande".
Aquele olhar implacável me fez correr direto para a rodoviária, peguei um ônibus para o Rio e passei a meia-noite em um táxi, entalado no túnel Rebouças, mas ouvindo o foguetório de Copabacana. Que maravilha, que beleza!
Ah, basta a pressão caseira da nêga fungando no cangote, chega de pergunta sobre Réveillon no social clube dos botequins e outras rodas. Pera lá, num amola, dá-se um jeito, quem sabe para Bora-Bora, como no final daquele filme do Coppola, One from the Heart, sim, aquele mesmo, O Fundo do Coração, como no cartaz nacionalíssimo.
Que tal, e aí, topa?
Xico Sá
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