quinta-feira, 20 de novembro de 2008

DANÇA, BRASIL!

Começo dos anos 60. Na incipiente TV brasileira assisti a um comediante ensinar como se dançava o Twist, dança criada por negros americanos no embalo do rock’n’roll . Com uma toalha nas mãos ele mostrava que dançar era como enxugar as costas, balançando as pernas em sentido inverso ao dos braços. Cresci acreditando que dançar era um gesto natural, tão presente na rotina da vida quanto se enxugar após o banho...

Cresci e a dança ganhou outros significados. Na adolescência, ir a bailes era quase um ritual de acasalamento. Claro, tudo simbólico, pois que naqueles tempos mulher casava virgem, e o homem descobria um jeito geralmente solitário de sublimar sua rebeldia hormonal...

Já adultos, muitos de nós esquecemos a riqueza desses rituais. Já não dançamos, e nossos corpos quedam moldados pela dimensão da rotina, a movimentação rítmica do trabalho e a lerdeza do sedentarismo. Alguns poucos rompem essa triste sina e se aventuram freneticamente a redescobrir que ainda podem ser felizes – se não pela liberdade de sonhar, ao menos pela possibilidade de permitir ao corpo movimentos que ficaram adormecidos nalgum lugar do passado.

As últimas gerações cresceram acreditando que a postura é fundamental para o respeito social tanto quanto a gravata e o paletó são essenciais para a obtenção de um bom emprego. A sisudez continua identificada com seriedade e respeito. A máscara vale mais que o rosto, a casca impressiona bem mais que o miolo.

A dança é um dos sintomas que medem nosso grau de desumanização. Há muitos outros, mas este talvez seja um dos mais emblemáticos. Perder a vergonha, chacoalhar o esqueleto ao sabor do ritmo, se enxugar no banheiro enquanto relembra aquele velho rock´n´roll, são manifestações de alegria e liberdade.

A mistura de raças nos fez um povo inconfundível. Dançamos para os orixás, cantamos nas igrejas, gozamos o carnaval, jogamos a capoeira... Encontrar nosso caminho na história passa obrigatoriamente pelo resgate de nossa memória corporal. Sem preconceitos, medo ou vergonha.

Dança, Brasil!
Alexandre Pelegi

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